A Borra - CAMARIM 6825: uma superversão para Roda Vida

Escrito em 30/11/2025
Edson Cândido (@edson_candido1)

A Borra - Espaço de reflexão crítica sobre as Artes Cênicas no Ceará


Zé Celso no piso subterrâneo do Teatro Oficina. Foto: Lilo Clareto

 

Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu

A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá

Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração

A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir

Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá

(..)

Um dos momentos mais marcantes da minha trajetória artística foi ter assistido Roda Viva, dirigido pelo saudoso José Celso. Foi mágico, desses encantamentos que atravessam o corpo e nunca mais deixam de ecoar. Sempre que vejo algo do Teatro Oficina, sou imediatamente levado àquele instante luminoso, ao gesto vivo do Zé, esse Deus pagão e divino que incendiava tudo com sua presença. Antes do encantamento final do Zé, tive a graça de ver aquela montagem, um rito, um transe, uma chama que continua acesa em mim até hoje.

Última versão do Oficina: Veja clicando aqui.

Roda Viva foi a primeira obra escrita por Chico Buarque, em 1967, com estreia no Rio de Janeiro em 1968. O texto aborda o período sombrio da ditadura militar. Esse tempo passou, mas é sempre necessário mantermos o alerta! O espetáculo recria, em episódios, as situações históricas que marcaram a montagem de José Celso Martinez Corrêa em 1968, ditadura na veia e nos calabouços.

UM CAMARIM, VIVO!

 



Foto: Divulgação

Ontem (29/11), assisti ao espetáculo “CAMARIM 6825: uma superversão para Roda Vida”, trabalho de conclusão da 38ª Turma de Licenciatura em Teatro do IFCE, com encenação de Fran Teixeira.

Sobre o processo de criação do CAMARIM 6825: uma superversão para Roda Vida:

“A Tropicália foi a febre que nos contagiou, a "Terra em Transe" que Zé Celso anunciou e que hoje pulsa em nós. Um movimento que nos ensinou a devorar o mundo para reanimar nossa própria alma. É a arte que se faz corpo, a voz que se faz luta, a poesia que ganha licença para gritar.

Nesse palco, os Parangolés são mais que tecidos: são convites para vestir a arte e dançar a vida. Eles nascem da memória de Hélio Oiticica, mas renascem em nossos corpos como uma segunda pele, uma bandeira íntima”

Posso afirmar que saí em catarse. Que turma talentosa! Que montagem potente e inovadora. A dramaturgia foi muito bem elaborada, respeitando histórias silenciadas que ficaram no porão da ditadura. Foi um verdadeiro trabalho em equipe entre técnica e elenco. Muito corajoso para uma turma tão grande: alinhar cenas, rascunhar, errar, acertar, voltar, seguir… Mas, quando o teatro é feito com seriedade e esmero, o resultado aparece.

Destaque para toda a equipe técnica: da genialidade da luz à preparação vocal, trilha sonora, da projeção de imagens aos demais elementos que sustentam a cena. Viva os técnicos, essa galera que fica nos bastidores e que foi tão bem representada nessa montagem ousada, que, para mim, está entre as melhores que já vi como conclusão de curso de licenciatura do IFCE.

O ator Alisson Emanoel está soberbo em cena: uma atuação ímpar. Sustenta o personagem com segurança em todas as cenas e demonstra pleno domínio do jogo cênico. Destaque também para a pequena grande Anabel Lessa, uma força em cena. De modo geral, o conjunto cênico está em perfeita sintonia com a pesquisa documental proposta pela encenadora Fran Teixeira.

Espetáculo que pulsa a resistência de fazer arte. Trata-se de um espetáculo-denúncia.

Em tempo: CADÊ O TEATRO QUE ESTAVA AQUI? Um grito dirigido aos equipamentos públicos ora fechados, ora sem manutenção. Os estrondos na guitarra, no momento da execução, evidenciam a falta de reforço no sistema operacional do Teatro Dragão do Mar. O Dragão, que na atual reforma já não ampara os vendedores ambulantes, agora cospe fogo no verde que há muito deixou de habitar seu entorno.

Que esse grito, impulsionado pelo teatro político apresentado pela turma do IFCE, e visto na encenação, se desdobre no cotidiano. Que se manifeste na participação ativa em movimentos políticos, como os fóruns de teatro, o Movimento Pavio, o Fórum de Linguagens e outras organizações da sociedade civil. Todo teatro é política, mas todo artista precisa ser um agente atuante na política cultural.

Bom vê a galera surgindo na cena. Sangue novo no mercado.  Cresce o curso de Licenciatura do IFCE, cresce a cena local, cresce — vigoroso — o teatro cearense.

Viva Zé Celso!
Viva o curso de Licenciatura do IFCE!


FICHA TÉCNICA — C A M A R I M 6825

Encenação:
Fran Teixeira

Elenco:
Adriana Silveira, Alisson Emanoel, Ana Vitoria Almeida, Anabel Lessa, Bruna Machado, Carlos Davi, Edinir Lourenço, Edith Sousa, Hirlana Vaz, Isabelle Maciel, Julius France, Jean Augusto, Junior DX, Kawany Cristina, Kaylane Costa, Leon Valcante, Markos Medeiros, Maria Duarte, Niel Santos, Pedro Crisóstomo, Rebeca Lemos Carvalho, Rosy Manfren, Samus, Thaís Viana, V. Oliva, Venicius Gomes

Dramaturgia:
Alisson Emanoel, Fran Teixeira, Isabelle Maciel, Junior DX, Julius France, Rebeca Lemos Carvalho, V. Oliva

Produção:
Alisson Emanoel, Ana Vitoria Almeida, Anabel Lessa, Carlos Davi, Edinir Lourenço, Jean Augusto, Julius France, Junior DX, Hirlana Vaz, Kawany Cristina, Kaylane Costa, Thaís Viana

Figurino:
Elson Brito

Iluminação:
Walter Façanha, Jão

Vídeo Mapping:
Ti Ego

Trilha Sonora Original:
Pedro Crisóstomo, Venicius Gomes

Arranjos Musicais:
Julius France, Pedro Crisóstomo, Venicius Gomes

Preparação Vocal:
Clara Luz, Bruna Machado, Venicius Gomes

Cenografia:
Ana Vitoria Almeida

Assistência de Cenografia:
Anabel Lessa, Edinir Lourenço

Objetos Cênicos:
Edinir Lourenço, Kawany Cristina, Maria Duarte

Coreografia:
Isabelle Maciel, Jean Augusto

Maquiagem:
Markos Medeiros, Thaís Viana

Comunicação e Mídias:
Jean Augusto, Markos Medeiros, Rebeca Lemos, V. Oliva

Pessoa Jurídica:
LabPlural

Instagram:
@espetaculocamarim6825

Programa do espetáculo:
https://drive.google.com/file/d/1Rm3Ti391KpMrs6v-6aoOnz34BIi94oUM/view

 

 


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