AS CARTAS NÃO MENTEM JAMAIS

Escrito em 02/11/2025
Edson Cândido (@edson_candido1)

A Borra - Espaço de reflexão crítica sobre as Artes Cênicas no Ceará


Espetáculo "As cartas não mentem jamais". Foto: Thácila Morena

 

Como de costume, aos domingos de manhã, o rei Roberto Carlos ecoa pela FM 93:

“Eu quero ser sua canção
Quero ser seu tom
Me esfregar na sua boca
Ser o seu batom
O sabonete que te alisa
Embaixo do chuveiro
A toalha que desliza
No seu corpo inteiro.”

E foi assim, embalado por essa nostalgia melosa e deliciosa, que me inspirei a falar de romance e suspense.
Foi nesse clima que me lembrei do espetáculo “As Cartas Não Mentem Jamais.”

Logo de cara, o teatro cearense mostra sua potência — um celeiro que não para de parir atrizes com interpretações únicas.
A força bruta e sensível de Fran Raulino e a delicadeza madura de Maiara Teles, com seu olhar 43 que hipnotiza, se encontram em cena com uma sintonia invejável.

Quando um ator recebe um texto potente, bem escrito, as cartas realmente não mentem.
O texto nasceu da cabeça genial de Aldo Evangelista. Um querido conhecido de outros carnavais — lá das brenhas de Icó, a terra do Senhor do Bomfim, Aldo é um menino de família boa. Bem criado.

A peça fala de um boy, vivido pelo experiente ator George Alexandre, que consegue enganar duas amigas: Izolda e Joana — atrizes, cúmplices, companheiras de apartamento e de angústias da profissão de fazer teatro.

Esse boy...
Perfil: eletricista, o famoso “faz-tudo”.
O tipo que elas adoram: o CAFUÇU!

Atire a primeira pedra quem nunca teve um boy lixo?
As personagens se iludem, se apaixonam e caem nas armadilhas desse boy, mas — sejamos sinceros — quem nunca, na carência, acreditou demais?
Quem nunca entrou num aplicativo (Grindr, Tinder, Badoo...) e se jogou?

Quantos de nós não seguimos esperando o príncipe encantado, depositando todos os planos e esperanças no primeiro boy lixo que aparece?

Mas — como toda carta revelada — tudo tem um preço.
No espetáculo, o boy tem um final surpreendente.
E, convenhamos, fora da ficção, alguns desses boys também conseguem seus “êxitos” — infelizmente.


“Uma mulher perdeu R$ 200 mil após ser enganada por um homem no famoso golpe do amor”. Gustavo Guedes se apresenta como empresário e fazendeiro em aplicativos de relacionamento e teria aplicado o mesmo golpe contra várias médicas. #NotíciasBGManhã” (Balanço Geral - TV Record)



Balanço Geral - TV Record

O golpe do amor, aplicado tanto em homens quanto em mulheres, tem se tornado uma prática criminosa cada vez mais comum nos aplicativos de relacionamento.
O roteiro é quase sempre o mesmo: bom papo, gestos de carinho, palavras doces, educação exemplar e a aparência de quem tem boa situação financeira.
Tudo para conquistar confiança — e depois, o golpe.

Também conhecido como estelionato sentimental, esse crime se baseia em falsas promessas de afeto e envolvimento emocional, com o objetivo de obter vantagens financeiras.
Casos recentes, no Brasil e no mundo, comprovam o aumento dessa prática, com prisões e denúncias cada vez mais frequentes.

A polícia alerta para que ninguém caia no golpe do amor:

  1. Evite enviar dinheiro ou informações pessoais e financeiras a quem você só conhece virtualmente;
  2. Desconfie de perfis com fotos duvidosas e nunca se sinta pressionado a compartilhar dados sensíveis;
  3. Faça chamadas por vídeo, use os recursos de verificação dos aplicativos e desconfie de histórias urgentes ou manipulações emocionais.

Na ficção, “As Cartas Não Mentem Jamais” mergulha nesse universo com lirismo e crítica.
O espetáculo é lindo, de encenação melodramática, com uma luz desenhada com precisão e sensibilidade. Feita e refeita no RESISTENTE Teatro Morro do Ouro, no Theatro José de Alencar.
Tudo respira as cores de Almodóvar, as cores de Frida Kahlo, as cores de Aldo Evangelista.

Aldo — esse artista completo — atua, escreve, dirige e ainda assina e executa ao vivo uma sonoplastia de bom gosto e delicadeza.
Um criador intenso, que domina o palco com presença e sensibilidade.

Causa certo estranhamento as entradas e saídas de cena, ora pela porta da rua, ora pelo quarto, mas nada que comprometa o conjunto da obra.
O texto é extraordinário, e a direção, acertada e generosa.O trio de atores — ou melhor, o quarteto formado por Maiara Teles, Fran Raulino, George Alexandre e Aldo Evangelista — demonstra cumplicidade e entrega em cada gesto.

O texto é extraordinário, e a direção, acertada e generosa.

O espetáculo funciona, pulsa, convence. Vida longa!

 

Ficha técnica

Texto e direção: Aldo Evangelista

Elenco: Maiara Teles, Fran Raulino, George Alexandre, Aldo Evangelista;

Operação de Luz e Som: Wladimir Cavalcante;

Produção: Coletivo Teatro Moska.

 

Por Edson Cândido (@edson_candido1)


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